Ex líder sérvio diz ter bebido urina para sobreviver

27/04/2010 18:08

Folha Online

O muçulmano bósnio Zulic Ahmet contou nesta terça-feira que, na falta de água, ele teve que beber sua própria urina durante seu confinamento. Ahmet foi a primeira testemunha na retomada do julgamento do ex-líder sérvio-bósnio Radovan Karadzic, acusado de genocídio pelo Tribunal Penal Internacional para a antiga Iugoslávia (TPII).

Karadzic, 64, boicotou em 26 de outubro de 2009 a abertura do processo, alegando que não teve tempo de preparar sua defesa, da qual cuida sozinho. Com esta estratégia, conseguiu adiar até este ano a retomada do julgamento.

Ex-presidente da autoproclamada República dos Sérvios da Bósnia, ele é acusado de crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio durante a guerra da Bósnia, mas se declara inocente.

Ahmet falou sobre a "limpeza étnica" conduzida pelas tropas de Karadzic em Sanski Most (Bósnia) e a brutalidade e desumanidade do campo de detenção ao qual foi levado. Ele disse que viveu com dezenas de outros detentos em uma pequena garagem e afirmou que apanhava frequentemente.

"As vezes um homem nos segurava enquanto outro nos golpeava com bastão", disse Ahmet, acrescentando que ele recebeu uma surra brutal por se recusar a se render, como pediu um soldado. "Quando uma criança observava, os sérvios diziam que estavam praticando karatê", disse ele.

Sem água e confinados em espaços pequenos, muitos prisioneiros morreram por desidratação, segundo o relato do ex-prisioneiro. "Alguns morriam no meio da noite, em meio a gritos que pareciam durar uma eternidade. Outros morriam silenciosamente".

Ele diz ainda ter sido testemunha do assassinato de 20 homens em 1992, que os soldados sérvios obrigaram a cavar sua própria cova antes de morrer.

Os doentes não receberam tratamento médico até a chegada das equipes da Cruz Vermelha à região e muitos preferiram se calar e recusar tratamento com medo das ameaças dops dirigentes do campo de concentração --que queriam esconder as provas de maus-tratos.

Zulic já foi testemunha de acusação contra o ex-presidente iugoslavo Slobodan Milosevic, morto em 2006 em sua cela antes de terminar o processo.